SOBRE O METAL NACIONAL

Em meio a tantos conflitos de opinião, exaltação de alguns fãs em relação à opinião de suas bandas e artistas favoritos e desaprovação de atitudes de outros tantos falarei aqui sobre o que penso ao ler tanta informação em tantos lugares e em tão pouco tempo.

M.O.A.

Não fui ao evento e nem manifestei a intenção de ir. Tinha outros shows em vista e como não sou filho do Eike Batista nem ganhador da Mega-Sena de final de ano tive que fazer escolhas. No meu caso felizmente os shows que optei ver rolaram com tranquilidade.
Mas não vou bancar o profeta de fato consumado e tão pouco sentar o dedo na região escolhida para a realização do evento.
Em primeiro lugar porque mesmo não indo torci mesmo para que o evento desse certo. Tenho uma banda e o sucesso de uma empreitada desse porte só fortalece o esquema todo.
Descer o pau em terem trocado o eixo SP/RJ/RS é uma bobagem de gente bairrista. Uma galera vai todo ano no Wacken (que fica na Alemanha) e vem falar que São Luiz é longe?
Qual é?
OK, o Wacken é um evento certo, mas culpar a logística pelo fiasco não tem nada a ver. Tanto que recentemente vários eventos realizados nesse eixo SP/RJ/RS tiveram público abaixo do esperado, inclusive originando o primeiro manifesto do vocalista do Angra.
Infelizmente o M.O.A. não rolou, e como sempre quem "pagou o pato" foi o público.
Não por culpa do Maranhão, nem por culpa das bandas, mas sim por culpa de pessoas sem caráter.
O que resta é que os que foram lesados não descansem até que sejam devidamente ressarcidos de seus prejuízos.
E sem essa conversa mole de continuar a ir em shows promovidos pelos envolvidos "por causa da banda" que é justamente esse tipo de apelo que eles vão usar para apagar o completo descaso e abandono com o povo do M.O.A.
Boicote é a palavra. Se o show for um fiasco as bandas vão receber do mesmo jeito e na boa galera, sem esse romantismo todo. Os gringos levam a coisa num nível muito mais profissional do que a gente que ainda acredita em amor ao metal para resolver todas as adversidades.
Se der 10 pessoas no show de um Blind Guardian da vida o que pode acontecer é da produtora nunca mais trazê-los, mas se outra pessoa organizar e pagar eles voltam pra cá na semana seguinte como se nada tivesse acontecido, desde que a grana caia em suas contas bancárias, simples assim.

METAL NACIONAL

O Brasil é rico em musicalidade e isso rola em praticamente todos os estilos que os brasileiros se metem a fazer. No metal é claro que não poderia ser diferente! Temos excelentes bandas que fazem trabalhos que nos colocam sim em pé de igualdade sonora com qualquer outra nação.
O problema no entanto é que nossa cultura nos atrapalha um pouco. Se por um lado isso deixa as coisas num nível mais genuíno no que diz respeito à atitude e integridade do trabalho, por outro lado cria barreiras praticamente intransponíveis no que diz respeito à definitiva profissionalização da cena.
Funciona assim: no começo sua banda vai tocar de graça ou até mesmo pagar pra tocar. Com o passar do tempo vai surgindo o desejo de profissionalizar de vez a coisa. Isso demanda um investimento. Ao fazer essa injeção de verba (geralmente oriunda de outras fontes externas) a banda começa a projetar, num primeiro momento, o retorno do capital investido. Mas todo mundo sabe que shows com boas condições são cada dia mais escassos. A banda acaba virando refém de um esquema que - mesmo que ingenuamente - ela mesma ajudou a criar, quando lá no começo tocava em troca de X-Salada!
Ou você toca de graça - ou em troca de esmola - ou não toca nunca!
A outra opção é fazer um investimento ainda maior visando o mercado exterior e quem sabe cativar a atenção com uma possível projeção lá fora.
Das bandas nacionais mais celebradas entre a galera 90% delas fizeram algum barulho lá fora antes. Não vamos ser hipócritas de negar esse dado estatístico! Lógico que temos aqueles que suaram sangue e conquistaram seu espaço sem usar desse trampolim, mas são bem poucos casos e com um nível de reconhecimento bem abaixo dos frequentemente lembrados.
OK, o Korzus foi ovacionado sobre a participação no M.O.A. mas durante o restante do ano quantas notas lemos sobre Korzus e quantas lemos sobre Krisiun, Angra e Sepultura?
É fato. E não tem absolutamente nada de errado com isso, exceto a hipocrisia em se negar o que realmente rola.
O Shadowside recentemente vem ganhando atenção pois é fruto de um investimento constante de vários anos.
Tocamos ao lado dele no show de estréia da banda, em Itapira há vários anos atrás.
E a banda nunca cansou de perseguir seu sonho. Estão começando a colher melhores frutos agora. Mas quantas bandas dispõem desses recursos para ficar tanto tempo investindo?
As pessoas crescem, casam, têm filhos e algumas prioridades mudam. E o cenário não ajuda.

HEADBANGERS BRAZUCAS.

Não mudaremos o cenários com imposição. Não mudaremos a cabeça do público com nacionalismo bobo e sem sentido.
Não se trata das bandas mostrarem bons trabalhos.
Não se trata da banda do Edu não ser original ou do cara cantar em Inglês ou em Zulu!

Música - sobre o meu prisma - não tem bandeira. Eu não entro numa loja de CDs e procuro bandas pelos seus países. Eu tenho vários CDs de bandas nacionais em casa. Tenho vários CDs demos que compro nos shows que vou. Mas se eu não gosto da banda do meu vizinho de porta quero mais que ele se foda para vendê-la!
Posso até comprar o CD pra dar uma força (quantos parentes compraram os CDs da minha banda e odeiam rock!) mas frequentar os shows ou sair por aí elogiando só porque é brasileiro ou do meu "brother" jamais.
Se é bom vou elogiar. Se for uma merda vou guardar os comentários pra mim e não ouvir o CD ou ir nos shows.

É só isso. Não gosta do Edu, do Almah, do Angra, do Korzus, do Ratos de Porão, ou qualquer outra banda, é só não ir nos shows ou comprar seus produtos. Essa disputa de quem tem o pinto maior é uma das coisas mais toscas que existe no meio metal. E isso é coisa de brasileiro, mas não só com bandas nacionais. É um festival de gente comparando Michael Kiske com Andi Deris, Sammy Hagar com David Lee Roth e tantas outras discussões que não levam a lugar algum a não ser gerar infinitas brigas por gente que está cagando e andando pra quem posta esse tipo de bobagem.

Querem ajudar? Postem um link de alguma banda! Seja ela nacional ou não.
Se alguém abrir e não curtir, não crie comparações. Bote um "não gostei" e boa.
Manifeste sua opinião mas respeite o gosto alheio!

Daí sim estaremos somando ao universo que tanto gostamos.

UNDERGROUND E CENA NACIONAL.

Outra bobagem. Não existe cena, tão pouco Underground no Brasil.
Mais uma vez: As bandas underground no Brasil são aquelas que pagam pra tocar, ou tocam de graça. Isso não é ser underground, isso é trabalhar de graça. Seja por amor ao metal, por não precisar daquela grana ou por não ter metas ou objetivos grandiosos. O motivo das escolhas ou oportunidades não interessa.
O que não dá é pra chamar uma agenda de 20 shows (em troca de lanche e gasolina) no ano de underground ou de fazer parte de uma cena!
Parem com essa bobagem!
Underground tem nos EUA e na Europa.
Kamelot, Nevermore, Symphony X são bandas underground nesses lugares!
Angra e Krisiun são underground ainda! O brasileiro que tirou elas desse patamar e colocou numa espécie de limbo entre o mainstream e o underground.
Tocam em pubs e pequenas casas. Mas tocam o ano todo. Têm equipe, agenda, estrutura de booking e merchandising e o giro nesse verdadeiro underground faz com que a banda seja auto suficiente, ou que demande de muito pouco investimento externo.

O que leio de muita gente (bangers e membros de bandas obscuras) soa como se no Brasil quem frequentasse o underground recebesse uma espécie de selo de aprovação. É como se se sujeitar a esses padrões imundos de trabalho fosse algo edificante para o cenário e para as bandas e público.

Mas não é.

Continua propagando a imagem de que "quem toca metal no Brasil tem que fazer porque gosta". Quer dizer que ninguém pode querer mudar isso?

Eu gostaria que o Brasil tivesse um underground que fosse digno de receber esse nome.

Tocar no sacrifício e em condições precárias só causa euforia em quem está começando ou em quem já tomou tanto vinho Chapinha que já tá chamando Jesus de Jair!

A única coisa que descredita o discurso do Eduardo Falaschi é que ele não faz uma "mea culpa".

O que o Angra fez no seu auge para fortalecer a cena? Cara, já abri shows de Angra (tour Rebirth), Shaman (Tour Ritual), Dr. Sin, Sepultura.

Com exceção do Shaman e Dr. Sin (que fomos "veiacos" e pedimos par tocar em outro palco) todas as bandas nos foderam!

E o tamanho da pica é proporcional ao sucesso da marca.

O Angra nos deu 45 minutos pra montar o palco, passar o som e sumir dele. Nos proibiu de usar canais da mesa e iluminação e quando faltava 1 música pro nosso set acabar a equipe no expulsou do palco sobre ameaça de boicote!

Beleza de valorização do metal nacional, não?

Pois é.

No Roça N' Roll de 2007 o Sepultura era headliner. A banda atrasou a passagem de som e todas as bandas foram prejudicadas. Detalhe: enquanto o Sepultura transitava pelo imenso backstage todos os membros das outras bandas ficaram proibidos de entrar!
Soube pouco tempo depois que a banda Poison God viajou de Espirito Santo, gastou R$ 2.000,00 de transporte do bolso e não pode tocar pois o guitarrista teve hipotermia na madrugada daquele show!

É... tudo pelo metal nacional.

Isso sem contar as inúmeras e frustrantes tentativas de parcerias com bandas locais que ao longo de 14 anos tentamos por várias vezes realizar parcerias. Organizamos, convidamos, na maioria das vezes pagamos e na hora de receber o convite de volta, nada, cada um por si.

Então quando leio essas manifestações eu tiro o que tem de bom nelas.

Nem tudo que o Edu falou é mentira.

Mas quero mais é que SE FODAM eles.

Vem chorar agora que a água tá batendo na bunda, mas no tempo das vacas gordas nada fizeram para incentivar quem estava começando.

E até hoje isso rola.

Porque cada uma dessas bandas com mais renome não exige da organização dos eventos ao menos uma banda de abertura com repertório autoral?
Não precisa ir lá assistir, nem fazer de conta que gosta, mas dê uma chance de exposição.

O Shaman recentemente fez alguns shows pelo interior paulista e no cast só tinham bandas cover no repertório.
Nem vou entrar no mérito de discutir sobre essas bandas cover, mas a maioria delas já tocam nos bares e recebem cachê por suas apresentações. Convidá-las para esse tipo de evento só diminui ainda mais o espaço oferecido para as banda autorais, além de não acrescentar absolutamente nada de novo ao mercado, uma vez que fazem cover de artistas já consagrados e reconhecidos.

A CONCLUSÃO

Ao meu ver, exceto pelo empenho de muitas bandas e de algumas pessoas que ainda buscam coisas novas, nada está sendo feito para que o cenário mude ou comece a de fato existir.
O público deve exigir maior presença de bandas autorais em seus pubs e casas favoritas.
Vejo muita gente dizendo que não é obrigado a gostar de banda nacional e que as bandas nacionais têm que mostrar mais qualidade. Mas trocar todas elas por genéricos do Iron Maiden e do Guns N' Roses também é de lascar, não é mesmo?
E será que esse público tão impiedoso e incrédulo com o metal "made in Brazil" está mesmo ouvindo as bandas nacionais? Está mesmo prestando atenção?
Ou seja, conhecer antes de criticar!
Se achar uma bosta, não compre mesmo e não vá aos shows. Mas não saia correndo atrás da boiada ou comprando opiniões de outros sem antes tirar suas próprias conclusões.
Novamente, música não tem bandeira, mas não menospreze os artistas locais sem antes lhes darem uma chance.
Cabe também às bandas e músicos pararem com essa rídicula reserva de mercado (mercado esse praticamente inexistente) e, por fim, os veículos de comunicação não se omitirem dos fatos.

Acho que racionalizando (e não generalizando) podemos chegar numa conclusão e tomar uma direção onde todos possam sair ganhando: músicos, fãs e promotores e organizadores.

Rodrigo Bortoletto
LETHAL FEAR
www.soundcloud.com/lethalfear

 


Site criado por Suzana de Oliveira